Oie! Sigo viva!
Terminei de ler esse livro recentemente e confesso que deu um pouco de desânimo. Escrito por Nicholas Carr, “Geração Superficial” vai de encontro com o poder detrimental de estarmos todos conectados e até mesmo viciados no Google, Instagram, Youtube, e assim vai. É um livro escrito sob a ótica de um sociólogo acostumado com o mundo dos livros.
Nicholas Carr começa o “Geração Superficial” explicando o quanto nossos cérebros são plásticos (moldáveis), como caminhos neurais que são criados e utilizados mais vezes, tornam-se de mais fácil uso e por consequência, caminhos neurais não tanto utilizados são deixados de lado. A leitura mudou muito a formação neural do homem, sua socialização e forma considerada como “normal” de pensar. Tornamo-nos mais científicos, aprendemos a saber encontrar informações nos livros. Antes, até a criação da prensa de Gutenberg, dependíamos da nossa memória para lembrar de fatos histórios, e a leitura era para poucos abastados. Tanto é que a oratória era uma arte para poucos na Grécia e Roma Antiga. Somente filósofos e os considerados “homens” memorizavam longos textos, peças teatrais, discursos etc. Depois, esse privilégio passou para os teólogos, escribas, nobres. Ler era dispendioso, cansativo e complicado.
Porém, com a proliferação da prensa de Gutenberg, o livro tornou-se um bem mais comum. A memorização de discursos já não era necessária. Passamos a ler em silêncio, internamente, e começamos a dialogar conosco mesmo sobre o conhecimento adquirido. Nosso cérebro mudou, e muito. O pensamento profundo tornou-se normal (sabe quando você se concentra por horas a fio e uma tarefa e imerge naquilo? Carr define isso como “pensamento profundo”). Mas, com o advento e crescimento da Internet, as nossas pesquisas literárias tornaram-se repletas de links, páginas de internet abertas; a leitura agora é rápida, e com ramificações (“pensamento superficial”).
Com a dependência da Internet para usar mapas, achar conteúdo, ouvir música, comprimir tudo em vídeos e reels, nosso cérebro tornou-se mais distraído e dependente da internet. Agora, está mais difícil de ler um texto grande, de manter-se focado por longos períodos. O que queremos é informação rápida, sem reflexão, e de preferência queremos muitas páginas para termos a ilusão de que temos muitas escolhas boas.
De acordo com “Geração Superficial”, estamos cada vez mais ávidos para clicar em hyperlinks, e assim ramificar nosso conhecimento. Entretanto, quanto mais abas abrimos no nosso procurador de internet, menos focados e menos informação realmente absorvemos. A pesquisa e o conhecimento vira uma competição de leitura dinâmica sem retenção. O autor comenta como grandes empresas megalomaníacas (oi, Google) estão moldando como pensamos e qual informações são consideradas relevantes (de acordo com o número de cliques).
Além disso, a internet e os provedores de busca moldaram nossa atual distração, de acordo com Carr. As imagens coloridas, aplicativos, gifs, páginas e mais páginas de marketing customizado para a sua compra de artigos, são métodos de nos fisgar (e manter) na rede interminável da internet. Provedores de busca estão sempre otimizando maneiras de te manter conectado com informações, e ao mesmo tempo desconectado de conhecimento.
Você pode me dizer que “Ah, mas o Google e as comunidades de rede me trouxeram muitos benefícios, agora tenho mais amigos e aprendi coisas antes bem remotas para mim!”. Verdade, não tiro sua razão. Porém, seus amigos virtuais são realmente seus amigos? Você pode contar com eles quando seu mundo desabar, ou vão só mandar uma mensagem do tipo “Melhoras! Tô torcendo por você”, ou então o famigerado “Gratidão pelo que já teve. Bola para frente”. Você não acha que, apesar de ter aprendido algo, está mais distraído do que antes? E esse aprendizado, dura até hoje?
Os benefícios da internet e de manter-se conectado são inúmeros, mas também há muitos malefícios não muito bem conhecidos e ignorados pela quantidade de informação disponível. Afinal, se o Google me retorna páginas sem fim de informações, por que isso seria ruim? Só lembre de que você acha o que quer na internet de acordo com o logaritmo do Google.
“Geração Superficial” é um livro desatualizado, contudo. Escrito em 2009, as mudanças da década seguinte não foram analisadas. Entretanto, nota-se que a temática é atual, relevante e cada vez mais certeira. A internet nos mudou para melhor e para pior também. Vê-se a quantidade de fake news e títulos sensacionalistas para gerar mais cliques e assim, continuar o ciclo vicioso da desinformação. A melhoria foi a conectividade com outros mundos, em detrimento do desenvolvimento interno.
É complicado se manter em pé nessa corda bamba da internet. Viver desconectado é difícil, se não impossível, dependendo do seu trabalho. Estar conectado 24/7 é o normal – pandêmico ou não. O importante é saber dos malefícios que a internet pode vir a exacerbar em nossos neurônios e comportamentos. Ademais, somente daqui a 50 anos ou mais sabemos qual foi o real efeito da internet, já que teremos mais gerações que nasceram sob a ótica virtual por completo.
Após ler esse livro entrei no dilema da existência desse blog. Já que a maioria não lê, para quem eu escrevo? E ainda, por que eu escrevo? Bom, pessoalmente, eu acredito nos livros e na capacidade de mudança que a leitura traz. Acredito nas palavras, e nos diálogos internos e externos sobre ideias apreendidas – porque não basta somente ler, você tem que conversar com outras pessoas sobre o que leu. A internet possibilitou a disseminação de ideias, mas também retirou a relevância da digestão de ideias. Por isso, criei o blog. Estou usufruindo da liberdade de escrever o que eu quiser – e publicar isso sem precisar de um editor externo -, e espero criar um diálogo com você, leitor curioso.
Nota final: 8.5/10.0. Um livro muito bom, desolador, mas também trouxe esperança de como podemos ver a realidade digital sob uma nova ótica, sem mundo cor de rosa.
Sem receita hoje, mas segue a indicação do documentário “Dilema Social”, disponível no Netflix. Enfim, a hipocrisia, usar da conectividade para se desconectar o máximo possível.